Garimpo clandestino em terras Yanomami cresce 7% em 2023, diz relatório

Ministro Ricardo Salles, Meio Ambiente, participa da Operação Verde Brasil 2, do Ibama, durante o combate ao garimpo Clandestino no Pará, minicío de Jacareacanga (PA). Sergiom Lima 05.08.2020

Brasil – A área de garimpo ilegal na Terra Indígena Yanomami cresceu 7% e atingiu 5.432 hectares em 2023. O dado foi divulgado nesta 6ª feira (26.jan.2024) em relatório do ISA (Instituto Socioambiental) e da Hutukara Associação Yanomami. Eis a íntegra do levantamento (PDF – 3 MB).

O número registrado em 2023 é menor do que o compilado de 2022, quando o avanço da atividade foi de 54%. “No entanto, este incremento revela, também, que a atividade ilegal continua operando com intensidade no território”, diz o relatório.

O texto, que reúne dados referentes à presença de garimpeiros na TI, diz que a atividade mineradora continua a produzir “efeitos nocivos” para o bem-estar da população indígena, mesmo com o estado de emergência de saúde decretado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Classifica, ainda, as ações do governo federal na região como “insuficientes”.

O documento usa dados do SMGI (Sistema de Monitoramento do Garimpo Ilegal), entrevistas com residentes na terra indígena e dados fornecidos pela organização ambiental Greenpeace.

DESMATAMENTO

Ao todo, 21 das 37 regiões da TI Yanomami registraram casos de desmatamento associados ao garimpo. O local mais devastado, segundo o mapeamento, foi a parte próxima ao rio Couto de Magalhães, com 78 hectares de mata devastados pela atividade de mineração.

Além disso, o Sistema de Alertas da TI Yanomami confirmou a presença garimpeira em pelo menos 13 regiões do território: Alto Catrimani, Alto Mucajaí, Apiaú, Auaris, Homoxi, Kayanau (Papiu), Maturacá, Missão Catrimani, Palimiu, Papiu (Maloca Papiu), Uraricoera, Waikás e Xitei.

As organizações creditam a insistência da atividade ilegal na região às ações pouco frequentes do governo na TI, em especial no 2º semestre de 2023. No período, o Ministério da Defesa assumiu as atividades de expulsão dos mineradores, antes executadas pelo Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis).

“Se no 1º semestre o conjunto de operações e medidas de controle de acesso ao território contribuíram para a saída de boa parte dos invasores, no 2º semestre, com o relaxamento das ações de repressão, especialmente depois que as Forças Armadas assumiram um maior protagonismo nas operações, observou-se a reativação e a intensificação da exploração em diversas zonas”, diz o relatório.

O documento narra como exemplo a destruição do posto de saúde de Kayanau, depois que um grupo de garimpeiros retornou à região com a saída das forças de segurança da União.

No Rio Uraricoera, os moradores relatam intensificação no trânsito “com o afrouxamento das operações”. O local é uma das principais formas de mobilidade do grupo de mineradores pela TI.

Os indígenas entrevistados ainda denunciaram a reativação de algumas pistas de pouso, como as de Mucuim e Espadinha, depois que muitas delas foram neutralizadas no 1º semestre de 2023.

SAÚDE INDÍGENA

Para as organizações, o combate à crise de saúde yanomami só será possível com a expulsão completa do garimpo da terra yanomami. O Poder360 questionou o Ministério dos Povos Indígenas e a Casa Civil para saber quais estratégias de retirada estão em curso, mas não teve resposta até a última atualização desta publicação. O espaço segue aberto.

De acordo com dados da Sesai (Secretaria de Saúde Indígena), até novembro de 2023 a TI Yanomami registrou:

649 casos de malária, contra 15.561 em 2022;
5.598 casos de síndrome respiratória grave em 2023, contra 2.478 em 2022;
20.524 casos de síndrome gripal em 2023, contra 3.203 em 2022;
9.550 casos de doenças diarreicas agudas em 2023, contra 5.902 em 2022.

Os dados completos do ano passado ainda não foram divulgados.

As organizações pedem o anúncio de “ações setoriais” e “integradas” para promover uma ação emergencial coordenada. Requerem, ainda, um Plano de Proteção Territorial que inclua, entre outros pontos, uma rotina de patrulhamento na TI e a reocupação das unidades de saúde abandonadas. Pedem, por fim, a ampliação das parcerias e cooperações técnicas com organizações especializadas em saúde para a região.

O Poder360 consultou o Ministério dos Povos Indígenas e o Ministério da Saúde com relação aos requerimentos dos grupos.

Em nota, o Ministério da Saúde informou que, desde janeiro de 2023, “aumentou o efetivo de profissionais, dobrou o investimento em ações de saúde e trabalhou para garantir a assistência e combater as principais doenças, como a malária e desnutrição no território Yanomami”.

O órgão menciona também a reabertura de 7 Polos Base que estavam fechados por ações criminosas de garimpeiros. Diz que 307 crianças diagnosticadas com desnutrição grave ou moderada foram atendidas e acompanhadas nos postos (leia a íntegra da nota do ministério no fim da publicação).

CRISE SUBESTIMADA

A ministra Sônia Guajajara já reconheceu que o governo subestimou a dimensão da crise na TI Yanomami e não resolveu o problema como prometido. Ela também disse que a questão não deve ser solucionada em 2024.

Em janeiro, quando assumiu o Planalto, Lula e uma comitiva de ministros foram a Boa Vista (RR) para reunião na Terra Indígena Raposa Serra do Sol. O governo anunciou medidas emergenciais para tratar a questão do povo indígena. Cerca de 1 ano depois, em encontro com os ministros do governo, o presidente afirmou que os problemas relacionados aos yanomami seriam tratados como questão de Estado.

Em 11 de janeiro deste ano, uma comitiva de ministros voltou a Roraima para monitorar a situação 1 ano depois de o governo federal decretar emergência em saúde pública na TI Yanomami. O governo também anunciou um investimento de R$ 1,2 bilhão em ações voltadas ao território, sobretudo na segurança e acesso a políticas públicas pelos indígenas.

Leia a íntegra do posicionamento do Ministério da Saúde:

“O Ministério da Saúde retomou as políticas de saúde e de cuidado após a desassistência e abandono que causaram graves danos à saúde da população indígena nos últimos anos. Desde janeiro de 2023, em uma ação interministerial, a pasta aumentou o efetivo de profissionais, dobrou o investimento em ações de saúde e trabalhou para garantir a assistência e combater as principais doenças, como a malária e desnutrição no território Yanomami.

“Ao longo de 2023, 7 Polos Base, que estavam fechados por ações criminosas de garimpeiros, foram reabertos. Nestas localidades, onde é possível prestar assistência e ajuda humanitária, 307 crianças diagnosticadas com desnutrição grave ou moderada foram recuperadas. A Pasta segue trabalhando em conjunto com as Forças de Segurança Pública para que as ações de saúde possam avançar.

“Entre as ações do Ministério da Saúde no território Yanomami, destacam-se também:

– Ampliação do número de profissionais em atuação no território (+40%, passando de 690 profissionais para 960 entre 2022 e 2023);
– Realização de testes em massa e busca ativa para detecção de malária (140.042 exames).
– Criação do Centro de Recuperação Nutricional para tratamento de crianças com desnutrição na CASAI.
– Investimento de mais de R$ 220 milhões para reestruturar o acesso à saúde dos indígenas da região – um valor 122% maior que o ano anterior, ou seja, a gestão atual mais que dobrou os recursos direcionados aos Yanomamis;
– Aumento de 9 para 28 profissionais do Mais Médicos em atuação no território ao longo do ano.

“Em relação à malária, o Ministério da Saúde esclarece:

“Para enfrentar a malária, a pasta enviou agentes de controle de endemia, com medicamentos e testes rápidos para realizarem a busca ativa de pacientes. Apenas em 2023, foram realizados mais de 140 mil exames para diagnóstico da malária no território, aumentando o número de notificações em relação ao ano anterior, onde não eram realizados exames e busca ativa em todo o território. As notificações só são possíveis após a realização de exame diagnóstico.

“Também foi elaborado um Plano de Ação para controle da malária na região, identificando as áreas prioritárias, com estratégias como a busca ativa de casos, o tratamento supervisionado, identificação de criadouros do mosquito vetor e instalação de mosquiteiros com insenticida de longa duração e termonebulização.

“Com relação à ação do garimpo nos Polos-Base, o Ministério reforça:

“Com a reabertura dos sete polos-base, que estavam fechados por ações criminosas, totalizamos 68 estabelecimentos de saúde com atendimento em terra Yanomami. Um pólo-base, de kayanaú, permanece fechado em decorrência das atividades do garimpo ilegal no local. Outros três funcionam parcialmente, durante o dia, pela insegurança causada pelo garimpo aos profissionais de saúde (Auaris, Surucucu e Xitei). Nos locais onde a assistência médica consegue acessar com segurança, é possível prestar os atendimentos necessários de emergência e de acompanhamento de saúde dos indígenas. Para garantir o acesso nos locais onde não há segurança, o Ministério da Saúde segue trabalhando de forma conjunta com as Forças de Segurança Pública.”

Fonte: Poder 360